Consumidor equiparado: vítima da relação de consumo

O conceito de consumidor não está restrito àquele que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, conforme preceitua o caput do artigo 2º do CDC (Código de Defesa do Consumidor), mas também abarca a figura do chamado consumidor equiparado, ou seja, do terceiro nas relações de consumo.

Ao ampliar a concepção de consumidor, a lei protetiva visou a alcançar aqueles que não são considerados destinatários finais, mas que sofrem os efeitos da relação originalmente estabelecida.

Entre as situações de consumidor equiparado merece atenção, por sua dimensão direta na proteção da pessoa humana, o caso das chamadas vítimas das relações de consumo, protegidas pelo disposto no artigo 17 do Código de Defesa do Consumidor, ao estabelecer: “equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”.

Salienta-se que a finalidade da norma foi a de ampliar a proteção legal àqueles que embora não adquirindo diretamente um produto ou serviço possam sofrer os efeitos da insegurança dos bens de consumo colocados no mercado.

Destarte, o legislador levou em conta o contexto dos chamados acidentes de consumo, entendido pelo Professor Sérgio Cavalieri Filho como “o acontecimento externo que causa dano material ou moral ao consumidor, decorrente de um defeito” (“Programa de responsabilidade civil”. São Paulo, Malheiros, 1998, p. 367).

Nesse contexto, cumpre salientar que não só o consumidor individual, mas também a coletividade de pessoas, podem sofrer as conseqüências dos acidentes de consumo, uma vez que estamos diante de mais uma dimensão de proteção da vulnerabilidade.

No tocante à responsabilidade por danos decorrente da propagação do defeito de qualidade, alcançando o consumidor e inclusive terceiros, vítimas do evento (conforme artigo 17 do CDC), o jurista Zelmo Denari destaca a necessidade da ocorrência de três pressupostos: defeito do produto; eventus damini (evento danoso) e a relação de causalidade entre o defeito e o evento danoso. (“Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do Anteprojeto”. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2004, p.177).

A relevância do consumidor bystander (aquele casualmente atingido pelo defeito) aparece com freqüência na jurisprudência em casos de profundo impacto quanto à proteção da incolumidade (físico-psíquica) da pessoa humana. Por exemplo, no caso da explosão no Osasco Plaza Shopping, ocorrido em 1996, o reconhecimento de pessoas, que apenas estavam de passagem pelas dependências do estabelecimento, como integrantes da relação de consumo (vítimas do acidente de consumo), foi de suma importância para a garantia do direito (Processo nº 1959/96, 5ª Vara Cível da Comarca de Osasco, SP).

Outro exemplo significativo foi o do reconhecimento da relação de consumo às vítimas atingidas em solo, em decorrência da queda de um táxi aéreo, quando em decisão unânime a 3ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) admitiu, inclusive, a inversão do ônus da prova (artigo 6º, VIII do CDC) ao consumidor equiparado.

No julgamento os Ministros do STJ ressaltaram que “esse alargamento do âmbito de abrangência do Código do Consumidor para todos aqueles que venham a sofrer os efeitos danosos dos defeitos do produto ou do serviço decorre da relevância social que atinge a prevenção e a reparação de eventuais danos. E a equiparação de todas as vítimas do evento aos consumidores, na forma do citado artigo 17, justifica-se em função da potencial gravidade que pode atingir o fato do produto ou do serviço. É o que se verifica na hipótese em análise, em que o acidente mencionado nos autos causou, não apenas prejuízos de ordem material ao autor, que teria sofrido, também, danos emocionais e psíquicos”. (Recurso Especial nº 540.235 – SP, DJ, 06.03.2006).

Assim, a extensão dada pelo CDC às vítimas dos acidentes de consumo é medida facilitadora da defesa em juízo (tendo em vista a possibilidade de inversão do ônus da prova, bem como a tutela coletiva dos direitos) e, sobretudo, de alta relevância para a proteção da pessoa humana nas relações de consumo.

CDC CNA ADVOCACIA