Indenização de R$ 120 mil para delegado que revista chamou de “incompetente”

Por maioria, a 9ª Câmara Cível do TJRS manteve condenação da Editora Globo, na condição de proprietária da Revista Época, por publicação de editorial em que chamou de "incompetente" o delegado de polícia Marcio de Jesus Zachello, que participava das investigações das mortes em série de meninos no Estado, ocorridas durante o ano de 2003.

A reportagem "Cemitério de Meninos", publicada em dezembro de 2003, informou que o avô de uma das crianças desaparecidas, um dia após seu sumiço, apresentou Adriano da Silva como suspeito aos policiais. O parente tinha conversado com testemunhas que afirmaram ter visto o menino em sua companhia.
No entanto, segundo a matéria da revista - Adriano teria sido liberado porque estava sem documentos, comprometendo-se a retornar no dia seguinte. Quando Adriano não apareceu, a polícia descobriu que ele era foragido do Paraná.
Em janeiro de 2004, a revista publicou o editorial "Carta do Editor – Caso Encerrado". O texto referiu: "incompetente; nada qualifica melhor o delegado Márcio Zachello, do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) do Rio Grande do Sul" . O texto se referia à liberação de Adriano da Silva, relatada na matéria anterior.
O delegado Marcio de Jesus Zachello relatou que "não era o responsável pelos inquéritos relativos aos crimes e sim que estava dando apoio à Polícia da região, mas a repórter da revista ré colocou na reportagem que o autor, na qualidade de delegado responsável pelo caso, acreditou que o acusado dos crimes retornaria à Delegacia".
A petição inicial salientou que ele fora designado para prestar declarações à imprensa sobre o caso. Defendeu que a empresa jornalística fez mau uso do direito à liberdade de expressão por ter atingir sua honra e imagem. Alegou que entrou enviou e-mail à publicação para esclarecer que há requisitos a serem preenchidos a fim de determinar a prisão de alguém e que existia uma impossibilidade técnica de saber que o homem apresentado como suspeito era foragido, não sendo possível, portanto, considerá-lo desde aquele momento como suspeito. Enfatizou que sua manifestação não foi publicada.
A sentença de primeiro grau, proferida pelo juiz Hilbert Maximiliano Akihito Obara, da Vara Cível do Foro Regional da Tristeza, em Porto Alegre, condenou a Editora Globo S.A.ao pagamento de indenização de R$ 250 mil por danos morais. O magistrado concluiu que "a prova testemunhal colhida revela o bom trabalho despendido pelo autor na sua profissão de delegado".
A empresa ré recorreu da decisão pedindo a reforma da sentença ou a redução do valor. O autor também apelou para que fosse aumentada a indenização.
Para a desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, "neste caso a liberdade de expressão e o direito à informação sucumbem diante do direito à imagem, porque ocorreram abusos". Ela citou o texto da Carta do Editor onde a ofensa é direcionada especificamente à pessoa do delegado e não à instituição da polícia. Observou que o excesso deu-se não pela personificação, mas pelo fato de sua caracterização como ´incompetente´ não ser verdadeira, uma vez que no momento da prisão e soltura de Adriano o autor não estava no local.
A respeito do valor dos danos morais entendeu ser excessivo o valor arbitrado inicialmente, sendo cabível sua redução para R$ 120 mil. A desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi acompanhou o voto.
O relator do recurso, desembargador Odone Sanguiné, teve o voto vencido no sentido de que não cabia indenização. Para o magistrado, apesar de o delegado não estar presente no dia da apresentação do suspeito, ele era responsável, de certo modo, pelo sucesso das investigações, uma vez que estava auxiliando a Delegacia de Passo Fundo e realizava o contato com a imprensa.
Seu voto salientou que o texto da revista, intitulado "Cemitério de Meninos" contem referência que possa ser considerada abuso do direito de informação ou de crítica. Por outro lado, o trecho do editorial onde o autor é chamado de "incompetente" é possível discutir sua licitude.
Processo nº 70025656257

Fonte: TJRS

CDC CNA ADVOCACIA